No passado fim-de-semana pus mochilas às costas e rumei a mais um acampamento de escuteiros para um sítio gelado e que fez com que pensasse na minha vida, nos planos que tenho traçados para o próximo ano e no quão frios os meus pés estavam. E, depois de voltar desta grande atividade, sabia que a próxima publicação que escrevesse teria que ser sobre este grande movimento que é o escutismo. Esta é uma publicação que tenho pensada há algum tempo, mas os dias passavam-se e as palavras não me saíam, porque não conseguia - e ainda não consigo com grande facilidade - expressar aquilo que sinto em relação ao meu percurso enquanto escuteira e aos ensinamentos que este movimento me trouxe.
Sei que existe ainda imenso preconceito da população uma vez que nós, escuteiros, somos vistos como as pessoas que utilizam meias até ao joelhos com pompons e que ajudam as velhinhas a atravessar a estrada. E existe muita gente que, tal como o sketch dos Gato Fedorento dizia, preferiam que os filhos andassem na droga a serem escuteiros. Foi por isso que senti que era importante homenagear um movimento que me é tão querido, que me ensinou e me moldou de uma forma inexplicável e que merece muito mais do que uma classificação tão generalista e sem qualquer fundamento. Ajudamos velhinhas a atravessar a estrada, sim, mas somos muito mais do que isso.
Comecei a minha caminhada nos escuteiros com 5 anos, através de uns parentes que também frequentavam os escuteiros e que incentivaram os meus pais a inscrever-me. Com uns calções 5 tamanhos acima do meu e uma mochila tão grande que parecia que não existia Marli, mas sim uma mochila com pernas, rumei à minha primeira atividade enquanto lobita num nervosismo tal e numa ansiedade grande por ser separada dos meus pais durante uma noite inteira. Mal sabia eu que, passados tantos anos, ainda sentiria a mesma ansiedade e nervosismo por rumar a uma atividade nova e diferente.
Nesta fase tão tenra da minha idade esta vivência foi essencial para que me desprendesse da asa dos meus pais e ganhasse as minhas próprias asas, ainda que pequeninas. Tornou-me uma criança mais dada, menos medrosa - embora ainda berre de cada vez que vejo um bicho maior do que o habitual - e muito mais independente, uma vez que lá não tinha o colo da minha mãe para correr sempre que fosse preciso. Levou-me a enfrentar os meus maiores medos e a batê-los.
Foi nos exploradores que aprendi que conseguimos fazer mais do que aquilo que pensamos conseguir. Na IIª secção do movimento escutista, passamos por algumas experiências muito diferentes de até então e aprendemos diversas coisas que nos desafiam - os nós botão em cruz, fazer uma mesa desde raiz, caminhar quilómetros, dormirmos ao relento ou orientarmo-nos sozinhos. Isto leva a que sejamos confrontados constantemente com coisas que, por vezes, nos ultrapassam enquanto pré-adolescentes que somos na altura.
Nunca me esqueço de uma atividade em que o meu chefe da altura teve que carregar a minha mochila porque eu pensava que não iria conseguir acabar a caminhada que estávamos a fazer - 20 quilómetros para uma rapariga cheinha não são assim tão fáceis, verdade seja dita. Mas a vergonha que senti nesse momento fez com que fortalecesse o meu carácter e levou a que nunca mais ninguém tivesse que me carregar em momento algum, apesar das adversidades. Porque se os outros conseguiam fazê-lo, porque é que não haveria de conseguir eu também?
A minha secção do coração foram os pioneiros porque foi nesta que eu aprendi que não existe ninguém mais forte do que nós próprios, basta acreditarmos. Apesar de ter sido confrontada com a possibilidade de ser guia de uma equipa em todas as secções por que passei, neste caso foi diferente. Sentia que era muito nova para tal responsabilidade e foi a minha chefe de secção que me abriu os olhos e fez com que sentisse que tinha valor para tal. E guardo esse voto de confiança comigo desde esse momento até ao momento em que passei pela mesma situação mas numa secção diferente, em que o voto de confiança foi reforçado. Não existe nada melhor do que alguém confiar em nós com algo que nós próprios não confiaríamos. Foi aqui que aprendi que tenho valor e que aquilo que faço, por mínimo que pareça aos meus olhos, pode fazer uma diferença gigante aos olhos de outra pessoa.
Esta secção ensinou-me que um bom espírito de equipa é essencial para um bom trabalho. E, a partir do momento em que atingimos uma harmonia com aqueles que nos rodeiam, é impossível algo correr mal - porque, mesmo correndo, temos sempre o apoio da nossa equipa. Aqui aprendi a respeitar o próximo, a ouvir a opinião de todos e a trabalhar em equipa.
A fase mais difícil da minha caminhada enquanto escuteira passou-se nos caminheiros, em que existiram diversas mudanças na minha vida - a mudança de cidade e o início de um novo percurso escolar num sítio onde não conhecia ninguém - que levaram a que a minha personalidade se alterasse ligeiramente - amadurecesse, como o vinho do Porto - e, uma vez que a secção nova não me estava a entusiasmar, estive presa apenas por um fio a este movimento. Mas fui-me mantendo, pelas amizades que tinha construído e pelo bichinho que ainda vivia dentro de mim e que adorava toda a mística escutista e isto leva-nos a uma das maiores lições que o escutismo me deu - nem sempre as coisas são boas, mas existe sempre algo melhor em frente. Não desisti, continuei no movimento e hoje, 2 anos depois desses meses estou extremamente motivada com esta secção e com tudo que ela me tem para oferecer. A nossa vida é um ciclo constante e nem tudo nos entusiasma sempre. Temos que aprender a gerir as nossas emoções e a pensar racionalmente - se algo nos fez tão feliz como este movimento me fez a mim, continuará certamente a fazê-lo, apesar da fase complicada que pode estar a passar.
A característica que mais valorizo em mim mesma e que foi fomentada ao longo de 15 anos enquanto escuteira por este bonito movimento é de que devemos estar sempre prontos para auxiliar o mais próximo. Tal como o nosso fundador, Baden Powell, sempre nos ensinou, temos que deixar o mundo um pouco melhor do que o encontrámos. E é com isto em mente que procuro sempre dar mais do que aquilo que tenho, sem pedir nada mais do que um sorriso em troca. A sensação de bem estar que temos de cada vez que ajudamos outra pessoa, de dever cumprido, é impagável.
Por fim, mas aquilo que é mais importante no meio de todos os ensinamentos e vivências que retiro desta enorme família - as boas amizades sobrevivem a grandes distâncias. Fiz grandes amizades neste movimento, amizades que levo certamente para a vida. Porque, apesar de não estarmos juntos todos os dias ou até todos os meses, quando nos vemos é como se não tivesse existido tempo nenhum entre os encontros. A conversa retoma, as gargalhadas surgem e o à-vontade mantém-se. E isto é do mais bonito e mais puro que podia haver.
A minha vivência está longe de acabar e ainda tenho muito a aprender com o movimento que inspirou esta publicação mas a verdade é que o escutismo ajudou a moldar aquilo que eu sou hoje em dia. Tornou-me mais solidária, mais altruísta, mais desinibida - dentro dos possíveis, claro -, mais descontraída e despreocupada com tudo - viva o cheiro a cavalo depois de um dia de caminhada, o pó na cara e o arroz com caruma - e fez com que eu valorize tudo aquilo que tenho - um bom banho depois de uma atividade, uma tenda que não se desmonta sozinha, uma noite bem dormida num terreno duro e a oportunidade de vivenciar tudo isto. Afinal é verdade aquilo que se diz: uma vez escuteira, para sempre escuteira.
Sei que existe ainda imenso preconceito da população uma vez que nós, escuteiros, somos vistos como as pessoas que utilizam meias até ao joelhos com pompons e que ajudam as velhinhas a atravessar a estrada. E existe muita gente que, tal como o sketch dos Gato Fedorento dizia, preferiam que os filhos andassem na droga a serem escuteiros. Foi por isso que senti que era importante homenagear um movimento que me é tão querido, que me ensinou e me moldou de uma forma inexplicável e que merece muito mais do que uma classificação tão generalista e sem qualquer fundamento. Ajudamos velhinhas a atravessar a estrada, sim, mas somos muito mais do que isso.
Comecei a minha caminhada nos escuteiros com 5 anos, através de uns parentes que também frequentavam os escuteiros e que incentivaram os meus pais a inscrever-me. Com uns calções 5 tamanhos acima do meu e uma mochila tão grande que parecia que não existia Marli, mas sim uma mochila com pernas, rumei à minha primeira atividade enquanto lobita num nervosismo tal e numa ansiedade grande por ser separada dos meus pais durante uma noite inteira. Mal sabia eu que, passados tantos anos, ainda sentiria a mesma ansiedade e nervosismo por rumar a uma atividade nova e diferente.
Nesta fase tão tenra da minha idade esta vivência foi essencial para que me desprendesse da asa dos meus pais e ganhasse as minhas próprias asas, ainda que pequeninas. Tornou-me uma criança mais dada, menos medrosa - embora ainda berre de cada vez que vejo um bicho maior do que o habitual - e muito mais independente, uma vez que lá não tinha o colo da minha mãe para correr sempre que fosse preciso. Levou-me a enfrentar os meus maiores medos e a batê-los.
Foi nos exploradores que aprendi que conseguimos fazer mais do que aquilo que pensamos conseguir. Na IIª secção do movimento escutista, passamos por algumas experiências muito diferentes de até então e aprendemos diversas coisas que nos desafiam - os nós botão em cruz, fazer uma mesa desde raiz, caminhar quilómetros, dormirmos ao relento ou orientarmo-nos sozinhos. Isto leva a que sejamos confrontados constantemente com coisas que, por vezes, nos ultrapassam enquanto pré-adolescentes que somos na altura.
Nunca me esqueço de uma atividade em que o meu chefe da altura teve que carregar a minha mochila porque eu pensava que não iria conseguir acabar a caminhada que estávamos a fazer - 20 quilómetros para uma rapariga cheinha não são assim tão fáceis, verdade seja dita. Mas a vergonha que senti nesse momento fez com que fortalecesse o meu carácter e levou a que nunca mais ninguém tivesse que me carregar em momento algum, apesar das adversidades. Porque se os outros conseguiam fazê-lo, porque é que não haveria de conseguir eu também?
A minha secção do coração foram os pioneiros porque foi nesta que eu aprendi que não existe ninguém mais forte do que nós próprios, basta acreditarmos. Apesar de ter sido confrontada com a possibilidade de ser guia de uma equipa em todas as secções por que passei, neste caso foi diferente. Sentia que era muito nova para tal responsabilidade e foi a minha chefe de secção que me abriu os olhos e fez com que sentisse que tinha valor para tal. E guardo esse voto de confiança comigo desde esse momento até ao momento em que passei pela mesma situação mas numa secção diferente, em que o voto de confiança foi reforçado. Não existe nada melhor do que alguém confiar em nós com algo que nós próprios não confiaríamos. Foi aqui que aprendi que tenho valor e que aquilo que faço, por mínimo que pareça aos meus olhos, pode fazer uma diferença gigante aos olhos de outra pessoa.
Esta secção ensinou-me que um bom espírito de equipa é essencial para um bom trabalho. E, a partir do momento em que atingimos uma harmonia com aqueles que nos rodeiam, é impossível algo correr mal - porque, mesmo correndo, temos sempre o apoio da nossa equipa. Aqui aprendi a respeitar o próximo, a ouvir a opinião de todos e a trabalhar em equipa.
A fase mais difícil da minha caminhada enquanto escuteira passou-se nos caminheiros, em que existiram diversas mudanças na minha vida - a mudança de cidade e o início de um novo percurso escolar num sítio onde não conhecia ninguém - que levaram a que a minha personalidade se alterasse ligeiramente - amadurecesse, como o vinho do Porto - e, uma vez que a secção nova não me estava a entusiasmar, estive presa apenas por um fio a este movimento. Mas fui-me mantendo, pelas amizades que tinha construído e pelo bichinho que ainda vivia dentro de mim e que adorava toda a mística escutista e isto leva-nos a uma das maiores lições que o escutismo me deu - nem sempre as coisas são boas, mas existe sempre algo melhor em frente. Não desisti, continuei no movimento e hoje, 2 anos depois desses meses estou extremamente motivada com esta secção e com tudo que ela me tem para oferecer. A nossa vida é um ciclo constante e nem tudo nos entusiasma sempre. Temos que aprender a gerir as nossas emoções e a pensar racionalmente - se algo nos fez tão feliz como este movimento me fez a mim, continuará certamente a fazê-lo, apesar da fase complicada que pode estar a passar.
A característica que mais valorizo em mim mesma e que foi fomentada ao longo de 15 anos enquanto escuteira por este bonito movimento é de que devemos estar sempre prontos para auxiliar o mais próximo. Tal como o nosso fundador, Baden Powell, sempre nos ensinou, temos que deixar o mundo um pouco melhor do que o encontrámos. E é com isto em mente que procuro sempre dar mais do que aquilo que tenho, sem pedir nada mais do que um sorriso em troca. A sensação de bem estar que temos de cada vez que ajudamos outra pessoa, de dever cumprido, é impagável.
Por fim, mas aquilo que é mais importante no meio de todos os ensinamentos e vivências que retiro desta enorme família - as boas amizades sobrevivem a grandes distâncias. Fiz grandes amizades neste movimento, amizades que levo certamente para a vida. Porque, apesar de não estarmos juntos todos os dias ou até todos os meses, quando nos vemos é como se não tivesse existido tempo nenhum entre os encontros. A conversa retoma, as gargalhadas surgem e o à-vontade mantém-se. E isto é do mais bonito e mais puro que podia haver.
A minha vivência está longe de acabar e ainda tenho muito a aprender com o movimento que inspirou esta publicação mas a verdade é que o escutismo ajudou a moldar aquilo que eu sou hoje em dia. Tornou-me mais solidária, mais altruísta, mais desinibida - dentro dos possíveis, claro -, mais descontraída e despreocupada com tudo - viva o cheiro a cavalo depois de um dia de caminhada, o pó na cara e o arroz com caruma - e fez com que eu valorize tudo aquilo que tenho - um bom banho depois de uma atividade, uma tenda que não se desmonta sozinha, uma noite bem dormida num terreno duro e a oportunidade de vivenciar tudo isto. Afinal é verdade aquilo que se diz: uma vez escuteira, para sempre escuteira.
Vocês são escuteiros?
Não sou escuteira, mas acompanhei o movimento de forma muito próxima pois tive grandes amigas que foram escuteiras até aos 16/17 anos, sensivelmente, e a minha mãe e tia também o foram. Conheço pessoas que com a minha idade continuam a fazer parte dessa família e acho que transmitem uma mensagem linda, oferecem um apoio imprescindível e ajudam crianças a crescerem e desenvolverem-se, como muito bem disseste ao contares a tua caminhada.
ResponderEliminarAdorei este teu texto, Marli! :)
Beijinhos,
Sónia R. Pinto
By the Library
Eu costumo dizer que toda a gente deveria passar por esta experiência! Sinto sempre que foram os escuteiros que me deram as ferramentas essenciais para a vida e ler este texto deixou-me uma nostalgia gigante porque, ao contrário de ti, não consegui ser firme e continuar na minha fase mais conturbada (que, por acaso, coincidiu com a tua). Tenho muitas saudades do que vivi durante 13 anos, mas sinto-me uma sortuda por ter tido a oportunidade de pertencer a este movimento (:
ResponderEliminarFui escuteira durante 8 anos e confesso que também aprendi muitas coisas!
ResponderEliminarAdorava ter sido, mas a minha mãe nunca me inscreveu... mas pronto. Boas lições!
ResponderEliminarEmbora me tenha inscrito nunca, algo que me arrependo, deve ser super divertido! :)
ResponderEliminarwww.styledays.pt
Nunca foi atividade que me despertasse interesse, mas conheço pessoas que adoram e têm excelentes memórias.
ResponderEliminarSou há cerca de 21 anos. Não conheço o mundo de outra forma. O teu texto descreve o que tento passar aos pais indecisos por porem os seus filhos na fase "bebé" deles...
ResponderEliminarExcelente texto. Irei partilhar :)
Olá sweet!
ResponderEliminarAdorei ler a tua experiencia como escuteira, também eu já o fui e tenho a dizer que adorei todos os momentos.
Apesar de nos prepararem para a vida, aprendemos a trabalhar em conjunto, o que por vezes, nos dias de hoje é bem difícil de encontrar.
Segui o teu blog <3
Quero convidar-te a visitar e a seguir o meu de volta <3
pimentamaisdoce.blogspot.pt
gostei muito deste texto! não sou escuteira nem nunca fui mas tenho uma prima que anda nos escuteiros desde os 10 anos (agora temos 20) e a verdade é que ela já viveu experiências incríveis à conta dos escuteiros! acho excelente o quanto eles puxam pelas pessoas, tanto em termos físicos como muitas vezes emocionais, as oportunidades de convívio com outras pessoas e com a natureza que oferecem e claro o voluntariado. acho mesmo incrível e tenho pena de nunca ter sido escuteira, agora sou muito velha para entrar mas um dia se tiver filhos vão ser escuteiros de certeza!
ResponderEliminarbeijinhos :) https://ratsonthemoon.blogspot.pt/